Festivais de cinema democratizam o acesso à sétima arte em cidades sem espaços de exibição

por: Cinevitor

tiradentes2019festivaisMostra Tiradentes: evento contribui para expandir o acesso a longas e curtas no interior de Minas.

Você sabia que o Brasil tem 90% de municípios sem salas de cinema? De acordo com o Sistema de Informações e Indicadores Culturais, divulgado pelo IBGE nesta quinta-feira, 5/12, no ano passado, ir ao cinema só era possível em 10% dos municípios do Brasil. Além disso, 39,9% das pessoas moravam em cidades sem, ao menos, um cinema. Ainda de acordo com o levantamento, 43,8% das crianças e adolescentes até 14 anos estão em cidades sem salas de exibição.

A boa notícia é que o país tem uma das mais importantes e ativas redes de eventos cinematográficos do mundo. Conforme dados da Ancine, Agência Nacional do Cinema, o Brasil conta atualmente com cerca de 200 mostras e festivais de cinema, realizados em todas as regiões do país, com programação gratuita. Em diversas cidades, os eventos cinematográficos são as únicas oportunidades de acesso a filmes para a população.

No sentido contrário a essa tendência, duas iniciativas realizadas em Minas Gerais levam o cinema a pessoas que têm dificuldade de acesso a essas produções artísticas. A Mostra de Cinema de Ouro Preto – CineOP e a Mostra de Cinema de Tiradentes, realizadas pela Universo Produção, levam o Cinema Sem Fronteiras, programa audiovisual de formação, difusão e circulação da produção fílmica para duas das mais importantes cidades históricas do estado, mas que não contam com salas de exibição.

Conforme destaca Raquel Hallak, coordenadora Geral da CineOP e a Mostra Tiradentes, “o Brasil tem um dos mais importantes e diversificados circuitos de festivais do mundo. Exibir filmes gratuitamente para a população é uma oportunidade de acesso, de aproximação, da produção cinematográfica com o público”.

*Leia aqui nossa entrevista com Raquel Hallak na 22ª Mostra Tiradentes.

A CineOP – Mostra de Cinema de Ouro Preto, cuja 14ª edição ocorreu em junho de 2019, leva uma intensa programação gratuita à cidade histórica com exibições de mais de cem filmes, entre curtas e longas-metragens no Cine Vila Rica, que está fechado há quase três anos, no Centro de Convenções e na Praça Tiradentes, que recebe a instalação de um cinema ao ar livre capaz de receber 500 pessoas. Além de filmes inéditos, a CineOP realiza mostras especiais com produções que marcaram a história da sétima arte no Brasil e apresenta projetos e curtas produzidos em ambiente escolar, fazendo a conexão entre cinema e educação. Em 2019, a Mostra beneficiou cerca de 15 mil pessoas ao longo de seis dias de programação.

O evento promove também sessões especialmente voltadas para os públicos infantil e juvenil, que são geralmente os mais atingidos pela falta de acesso às salas de cinema. Por meio da Mostrinha e do Cine Expressão, crianças e adolescentes, entre seis e 16 anos, podem conferir produções selecionadas para cada faixa etária e participar de cine-debates ao final de cada exibição.

vencedoresgostoso19Equipe do filme Pacarrete: prêmios em São Miguel do Gostoso.

Já a Mostra de Cinema de Tiradentes, que será realizada na cidade histórica localizada na região do Campo das Vertentes entre 24 de janeiro e 1º de fevereiro, chega à 23ª edição consolidada como maior plataforma de lançamento do cinema brasileiro contemporâneo. O município mineiro não tem cinema, mas durante o evento recebe uma infraestrutura com quatro espaços de exibição. Tiradentes tem sete mil habitantes e recebe ao longo dos nove dias do evento cerca de 35 mil pessoas. A programação intensa e diversificada da Mostra de Cinema de Tiradentes oferece gratuitamente ao público a exibição de mais de 100 filmes brasileiros em pré-estreias nacionais e mostras temáticas e homenagens.

O evento proporciona ainda a oportunidade do diálogo do público com os realizadores em debates, mesas temáticas e rodas de conversa. Assim como a CineOP, a Mostra Tiradentes promove também sessões especiais para as crianças na Mostrinha de Cinema e para adolescentes na Mostra Jovem, possibilitando o acesso a filmes para esse público e também o desenvolvimento do amor pela sétima arte.

Infelizmente, não é de hoje que a cultura brasileira é atacada, porém, neste ano, diversos acontecimentos têm prejudicado ainda mais o andamento de projetos, editais, festivais e outras atividades ligadas ao audiovisual. Em um ano tão positivo para o cinema brasileiro, com longas e curtas prestigiados por aqui e ao redor do mundo, é inadmissível compactuar com ideais tão retrógradas, que remetem à censura e a um descaso com diversos profissionais que se dedicam à arte.

documentandorussasAlunos da oficina Documentando, ministrada por Marlom Meirelles, no interior do Ceará.

Recentemente, fomos surpreendidos com a notícia de que a Ancine, Agência Nacional do Cinema, retirou das paredes de sua sede, no Rio de Janeiro, todos os cartazes de filmes brasileiros que estavam lá desde 2002 e faziam parte da decoração dos prédios. Também foi informado que uma TV que ficava na recepção e exibia trailers de produções nacionais foi desligada e todos os dados, como ficha técnica e pôster dos filmes, foram retirados do site da Ancine.

*Clique aqui e assista ao programa especial sobre os cartazes de filmes brasileiros gravado no Fest Aruanda, em João Pessoa.

Vale lembrar que o setor audiovisual brasileiro injeta mais de 25 bilhões de reais por ano na economia, maior que o turismo, por exemplo. Gera mais de 300 mil empregos e exporta talento, criatividade e trabalho. Além disso, nos últimos anos, nosso cinema tem ganhado muito destaque nos festivais mais importantes ao redor do mundo. Nossas histórias (todos os tipos de histórias, que devem e podem ser contadas) e nossa cultura são retratadas nas telonas em diversos gêneros, em grandes, pequenas e independentes produções.

Em 2019, o CINEVITOR participou de diversos festivais nacionais e internacionais, entre eles, a Mostra Tiradentes, Festival de Gramado, Mostra de São Paulo, LABRFF, Cine Ceará, entre muitos outros. Além das exibições dos filmes, esses eventos também proporcionam encontros potentes entre realizadores, público e imprensa, diálogos necessários, interação entre obra, autor e espectador, projetos interessantes, entre tantas outras atividades, como oficinas, debates e rodas de negócios.

Os festivais também se expandem além das grandes cidades, e do já tradicional circuito, e ficam ainda mais interessantes quando interagem com a população local, que não tem acesso à sala de cinema, como por exemplo a Mostra de Cinema de Gostoso, no Rio Grande do Norte, e o CINEFESTIVAL – Festival de Cinema do Vale do Jaguaribe, que aconteceu em Russas, no interior do Ceará, que também disponibilizou oficinas para os moradores, como a Documentando, na qual alunos realizam um documentário ao longo do evento e o exibem na noite de encerramento.

Nossa identidade ganha vida nas telonas, nos orgulha e movimenta a economia há anos. Isso causa um impacto social, cultural e econômico necessário e importante. O audiovisual brasileiro é uma indústria vibrante e criativa. Emociona, diverte, reflete, encanta e gera valor para o país. Cinema é arte. Cinema é cultura.

Fotos: Jackson Romanelli/Universo Produção, Joyce S. Vidal e Rogério Vital.

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