Os Primeiros Soldados: Rodrigo de Oliveira fala sobre o filme de abertura do Circuito Penedo de Cinema 2022

por: Cinevitor
O diretor durante o debate sobre o filme

Da junção de quatro consagrados eventos do cinema alagoano nasceu o Circuito Penedo de Cinema, que em 2022 chega à sua 12ª edição já consolidado no calendário brasileiro do audiovisual. O festival , que traz mais de 40 títulos em formato híbrido, além de atividades paralelas, começou nesta segunda-feira, 14/11, no Centro de Convenções Zeca Peixoto.

Banhado pelo Rio São Francisco, à beira da magia da história penedense, o Circuito começou a caminhar exclusivamente como Festival de Cinema Brasileiro, entre as décadas de 1970 e 1980, com a participação de diversos cineastas e artistas locais e nacionais. O antigo Cine São Francisco, como antes era intitulado e onde agora funciona o centro de convenções, foi o local que sediou, na época, as oito edições do festival.

A cerimônia de abertura deste ano, apresentada pelo ator Chico de Assis, contou com a apresentação da Orquestra Monte Pio dos Artistas, sob regência do maestro Júlio Catarina. Além disso, convidados especiais também subiram ao palco, entre eles, Josealdo Tonholo, reitor da UFAL, Universidade Federal de Alagoas, e Ronaldo Pereira Lopes, prefeito de Penedo.

Entre os discursos, Sérgio Onofre Seixas Araújo, coordenador geral do Circuito Penedo de Cinema, falou: “É um prazer muito grande estar neste espaço sagrado, neste templo do cinema, que já foi e voltará a ser um dos principais palcos de exibição de cinema nacional desse país”.

Depois disso, foi exibido o filme de abertura desta 12ª edição: o longa capixaba Os Primeiros Soldados, dirigido por Rodrigo de Oliveira, que se passa no começo dos anos 1980, em Vitória, Espírito Santo, e acompanha membros da comunidade LGBTQIAP+ que buscam formas de resistir à epidemia de AIDS

Na trama, um grupo de jovens gays e mulheres celebram a véspera de Ano Novo sem saber o futuro sombrio que lhes espreita. Suzano, interpretado por Johnny Massaro, um estudante de biologia que acaba de voltar dos estudos no exterior, sabe que algo muito errado está começando a afetar seu corpo. Primeira vítima de AIDS conhecida na cidade, ele enfrenta sozinha o desejo de entender melhor a doença e de buscar a cura, ao mesmo tempo que tenta proteger sua irmã Maura, papel de Clara Choveaux, e seu sobrinho Muriel, vivido por Alex Bonin, dos impactos do que está por vir.

O desespero com a falta de informações sobre o vírus e seu futuro incerto acabará por aproximar Suzano da performer transexual Rose, interpretada por Renata Carvalho, e do estudante de cinema Humberto, papel de Vitor Camilo, ambos infectados. Também como forma de homenagem à memória daqueles que enfrentaram a doença e seus estigmas em seu princípio, o filme teve seu roteiro original baseado em uma longa pesquisa dos casos reais ocorridos na cidade de Vitória que envolveu, além da leitura de jornais da época, entrevistas com profissionais de saúde, familiares e membros da comunidade LGBTQIAP+.

Johnny Massaro em cena do filme

Com uma bem sucedida carreira em festivais pelo mundo, o longa recebeu o prêmio de melhor filme segundo o público e o júri jovem no Internationales Filmfestival Mannheim-Heidelberg, na Alemanha; Prêmio Especial do Júri para a atriz Renata Carvalho no Festival do Rio e no International Film Festival of India; foi consagrado na 25ª edição da Mostra de Cinema de Tiradentes com o Prêmio Carlos Reichenbach de melhor longa da mostra Olhos Livres, além de ter participado de diversos festivais, como: Inside Out, no Canadá, Olhar de Cinema, Festival de Vitória, Philadelphia Latino Film Festival, Rio Festival de Cinema LGBTQIA+, Outfest Los Angeles LGBTQ Film Festival, entre outros.

Antes da exibição, o diretor bateu um papo com o público presente, que foi mediado por Rosana Dias: “Esse é um filme sobre o primeiro ano da epidemia da AIDS no Brasil. Nós, que hoje vivemos em 2022, passamos os últimos quatro anos sem nenhuma campanha federal de prevenção ao HIV e de alertas sobre os tratamentos disponíveis. A AIDS segue matando no Brasil 11 mil pessoas por ano e tínhamos a sensação de que isso não acontecia mais, que era coisa do passado. O filme é sobre isso: retomar o começo da epidemia no Brasil para justamente iluminar um pouco sobre uma possibilidade real de erradicar a transmissão”, disse Rodrigo.

E continuou: “É o filme que eu queria ter visto quando era adolescente. Não existia ainda um tratamento do cinema brasileiro para esse período específico da epidemia da AIDS no Brasil. E era uma lacuna que eu achava que deveria ser preenchida, sobretudo porque o HIV e a AIDS ainda são temas presentes; eles pertencem muito ao nosso tempo. E uma maneira de recomeçar essa conversa era voltar para o início para ver o que essas primeiras pessoas tinham para nos ensinar sobre como lidar com essa epidemia”.

Rodrigo completou: “Em obras de arte sobre a AIDS é comum falar de gente que morre. Esse filme é sobre gente que vive com HIV. A ideia de viver com HIV é algo relativamente recente por causa dos avanços da medicina. Hoje em dia, a pessoa que vive com o vírus, medicada da maneira certa, tem uma longevidade maior ou igual a quem não tem”.

Ao final do bate-papo, o diretor concluiu: “Todo mundo que entrou em contato com esse vírus viveu, sentiu, sonhou. A contribuição de Os Primeiros Soldados para esse debate é de lembrar que essas pessoas não são doentes ou vítimas. Elas são pessoas com pleno exercício de sua cidadania e do seu direito de existir. Conhecê-las dessa maneira faz com o que a gente tenha uma relação mais humana e mais empática no Brasil e no mundo”.

A programação do primeiro dia do Circuito Penedo de Cinema encerrou com os shows musicais do 3º Festival Alagoano de Rock, que ocorreu na Praça 12 de Abril. Participaram do encontro os artistas Wado, Lambertos, Janaina Melo, Morcegos e a banda Invisible Control.

*O CINEVITOR está em Penedo e você acompanha a cobertura do evento por aqui, pelo canal do YouTube e pelas redes sociais: Twitter, Facebook e Instagram.

Fotos: Kamila Feitosa/Divulgação.

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