5º Olhar de Cinema: Vera Valdez fala sobre A Última Terra e relembra momentos marcantes de sua carreira

por: Cinevitor

veravaldezcinevitor1Vera Valdez durante a entrevista para o CINEVITOR.

Exibido na mostra competitiva de longas-metragens do 5º Olhar de Cinema – Festival Internacional de Curitiba, o drama A Última Terra, dirigido pelo paraguaio Pablo Lamar, foi apresentado na segunda-feira, 13/06, pela atriz brasileira Vera Valdez, uma das protagonistas da história, que se passa em uma colina isolada, onde um casal de idosos vive em solidão. Ela está morrendo e ele a acompanha em sua passagem.

Emocionada com a repercussão do filme no festival, Vera Valdez conversou com o CINEVITOR sobre sua participação no longa e também relembrou alguns momentos marcantes de sua carreira, como: a época em que foi manequim da Chanel, a amizade com grandes nomes do cinema e do teatro e a influência da família em sua trajetória artística.

Confira os melhores momentos da entrevista:

UM CONVITE PARAGUAIO

“Eu estava filmando em Pernambuco e recebi um telefonema do Pablo Lamar, dizendo que era paraguaio e que estava começando um novo filme. Ele me mandou o roteiro e fiquei encantada. Fui me informar quem era esse diretor e vi que já tinha ganhado prêmios em festivais importantes. Fiquei mais curiosa ainda. Até que nos encontramos em São Paulo e ele me contou suas ideias. Logo, fui pro Paraguai e quando cheguei lá perguntei porque tinha sido escolhida para o papel em A Última Terra. E ele falou que conheceu o meu trabalho quando fez o som de Permanência [dirigido por Leonardo Lacca], filme que eu tinha rodado no Pernambuco”.

ENTROSAMENTO

“Foi tudo lindo porque era uma equipe muito unida e muito gentil. O diretor foi muito tranquilo comigo, até porque já conhecia a minha maneira de trabalhar e isso facilitou muito. Foi muito emocionante! A equipe fluía e você sentia que estava tudo certo, que estava funcionando”.

aultimaterracinevitorO ator Ramón del Rio em cena de A Última Terra.

MANEQUIM

“Eu nasci em Santa Teresa, no Rio de Janeiro, e fui aos 13 anos para Lisboa. Até que, dois anos depois, minha mãe conseguiu um trabalho em Bordeaux, cidade francesa dos bons vinhos. Ela trabalhava no consulado. Um dia fomos a um jantar maravilhoso, que eu fiquei completamente deslumbrada com tudo. Até que veio um senhor e perguntou se eu era manequim. E eu nem sabia o que era isso. Perguntei para minha mãe e ela disse que me explicaria depois. Certo dia, passando por uma banca na rua, minha mãe apontou para as revistas e disse que aquilo era manequim. Aí eu comecei a me interessar por isso. Depois, minha mãe foi transferida para Paris e uma amiga minha me avisou que tinha uma prima que trabalhava para a Elsa Schiaparelli, que era uma das grandes costureiras surrealistas da turma do Salvador Dalí. Uma verdadeira artista”.

GÊNIOS

“Lembro que a Schiaparelli tinha uma saia cheia de caranguejos enormes, com uma borboleta que era o símbolo do surrealismo. A Chanel era muito elegante e ela veio do nada. A mãe morreu de álcool e o pai era alcoólatra também. Ela pensava na mulher, o que poderia fazer daquela mulher. Simplesmente muito elegante. Eu trabalhei com gênios. E trabalho ainda, como o Zé Celso Martinez Corrêa, do Teatro Oficina, que é um dos grandes diretores do mundo”.

elsacinevitorElsa Schiaparelli: moda surrealista.

MÃE

“Minha mãe foi muito boêmia, muito liberal. Ela tinha muita autoridade. Eu lembro de coisas que eram precisas da modernidade dela. Ela conversava muito comigo. Lembro de uma história que ela contou que tinha ido na Lapa e sentado em um bar com vários marinheiros americanos. Eu achei fantástico porque víamos muitos filmes americanos de guerra”.

FAMÍLIA

“Minha vó era muito austera e fazia espetáculos com os filhos para arrecadar dinheiro para os pobres. Eu pertenço a uma família de artistas. Não tinha como eu não ser do teatro”.

MODELO DA CHANEL

“Todo mundo me achava parecida com a Coco Chanel e juntas viramos uma das coisas mais importantes de Paris. Tinha outra brasileira que trabalhava lá comigo, a Mimi Ouro Preto, que casou com um jornalista e nobre francês que tinha um castelo. Naquela época, a Chanel fez uma cabine de princesas. Tudo tinha nome de famílias francesas e ela adorou fazer isso. Pegar a nobreza e jogar no trabalho”.

GRETA GARBO

“Os desfiles eram quase uma apresentação teatral. O público ficava sentado e eu tinha que entrar e representar. E a Chanel tinha um palco com uns biombos chineses que a gente ficava espiando pra ver quem estava na plateia do desfile. Teve um dia que eu fui espiar e só conseguia ver um pé e pensei: ‘Só pode ser ela’. Quem era? Greta Garbo! Foi a convidada que mais me fascinou”.

verachanel3                                                                Coco Chanel e Vera Valdez em Paris.

LES AMANTS

“Fui ver o filme Amantes, do Louis Malle, que todo mundo falava que era um escândalo. Eu era bem moça na época e pra mim não teve nada demais, pois fui criada por uma mãe muito liberal e tinha conhecimentos. Certa noite, fui à uma boate com a Mimi [Ouro Preto], que era frequentada por pessoas nobres, que tinham títulos. Menos eu (risos). Estávamos numa mesa cheia de homens que eu nem sabia quem eram. Mas eu dava muita risada com a Mimi porque ninguém entendia o que a gente falava. De repente, começaram a falar do filme e eu me meti na conversa e disse: ‘Pelo amor de Deus! Que filme burguês’ e aí a Mimi me deu um chute embaixo da mesa e o rapaz que estava na minha frente me olhou e disse: ‘Muito prazer, Louis Malle’. Eu fiquei sem reação. Mas ele riu e disse que adorou meus comentários sobre o filme e concordou comigo. Depois disso, ficamos muito amigos. E ele sempre me pedia opiniões antes dos trabalhos. Tínhamos uma amizade íntima”.

MAURICE RONET

“Chegamos em um bar e o Malle estava lá, reclamando que estava se sentindo velho porque ia fazer 30 anos em breve. Logo comecei a reclamar também, dizendo que não aguentava mais ser manequim e ele me propôs entrar no cinema. Me interessei. Mas quando ele falou que eu tinha que ser atriz, não aceitei. Queria uma coisa diferente. Então ele me deu um livro pra ler e disse que começaria a escrever um roteiro. Eu e Mimi viajamos com ele e com os irmãos para um lugar afastado, com chalés, para ele se concentrar no trabalho. A gente lia e discutia o texto que ele estava escrevendo. Até que ele disse que eu e a Mimi seríamos responsáveis pela escolha do elenco. Eu sugeri o Maurice Ronet e ele não quis porque ele estava bebendo muito e dava problema no set. Achava perfeito para o papel, mas não queria. Até que ele concordou com uma condição: que eu virasse amante do Maurice pra não deixar ele beber. Eu topei”.

mauricecinevitorMaurice Ronet em cena do filme Trinta Anos Esta Noite.

LE FEU FOLLET

“Acabei ficando responsável pelo figurino [de Trinta Anos Esta Noite] também. Comecei a conversar com o diretor de arte e concluímos que o elenco tinha que usar roupas caras e de boa qualidade. Como eu era brasileira, sempre fui legal. Perguntei como seria meu pagamento e me disseram que eu teria que conseguir notas fiscais. Eu concordei e fui pegar roupas na Chanel. Entregava as notas pro irmão do Malle, que chegou pra mim e disse que eu era a que mais ganhava de toda a equipe, por causa dos valores das roupas. ‘Vocês não vão apresentar isso como despesa e pagar meu salário? Não posso fazer nada se as roupas são da Chanel’ (risos)”.

PARTICIPAÇÃO ESPECIAL

“Tava tudo pronto para filmar e o Louis disse que faltava uma atriz para uma personagem. E disse que eu que a interpretaria. Eu acredito que ele fez tudo isso programado, para me colocar nessa personagem, mas não quis me falar antes. Eu só dizia uma frase, mas fiz questão de falar com o meu sotaque. Ao final da cena, todo mundo me aplaudiu. O Louis estava com um sorriso no rosto e eu indignada com tudo aquilo (risos)”.

TEATRO

“Duas coisas me atraíram no teatro fortemente: uma foi Vestido de Noiva, de Nelson Rodrigues, que eu guardo cada detalhe dessa montagem de tão incrível que foi; e a outra é Zé Celso Martinez Corrêa”.

veravaldezcinevitor3Vera nos bastidores da entrevista.

L’ANTI-LEÇON D’ÉCONOMIE

“Eu vi um filme canadense aqui no festival que é extraordinário, se chama Oncle Bernard – Uma anti lição de economia, dirigido por Richard Brouillette. Todos deveriam ver. Que maravilha que é aquele personagem com uma noção incrível de simplicidade. Pela minha vivência, eu entendi tudo. O diretor encontra uma pureza e mostra o individualismo não por indivíduos como um só. Mas, o individualismo como liberdade”.

LA ÚLTIMA TIERRA

“A Última Terra foi premiado em Rotterdam, um festival muito importante. Eu estava curiosa para saber como tinha ficado o filme, para ver o trabalho dos meus companheiros queridos. Eles se apaixonavam por aquilo que estavam vendo durante as filmagens e vinham me mostrar, mas eu não queria ver, porque não gosto de ver o copião, sou muito crítica. Quando assisti aqui no festival, foi tudo uma surpresa”.

*O CINEVITOR está em Curitiba a convite do evento e você acompanha a cobertura do festival por aqui e pelas redes sociais: Twitter, Facebook e Instagram.

Fotos: Divulgação e Marina Capretti/Pipoca de Pimenta.

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