Festival de Locarno 2022: filmes brasileiros são premiados

por: Cinevitor
A diretora brasileira Julia Murat com o Leopardo de Ouro.

Foram anunciados neste sábado, 13/08, os vencedores da 75ª edição do Festival de Cinema de Locarno, considerado um dos principais festivais de cinema autoral do mundo. O Leopardo de Ouro, prêmio máximo do evento, foi entregue para o brasileiro Regra 34, de Julia Murat, da Competição Internacional de longas.

O longa conta a história de Simone, interpretada por Sol Miranda, uma jovem advogada, negra, que pagou a faculdade de direito com performances on-line de sexo. Ela acabou de passar em um concurso para defensora pública e, sua nova rotina, consiste em aulas em um curso preparatório para defensoria, o acompanhamento de sessões de acolhimento às mulheres vítimas de violência doméstica e aulas de kung fu.

Com o objetivo de despertar novamente o desejo sexual de Simone, Natália, papel de Isabela Mariotto, uma amiga de infância, envia um link de um vídeo de uma mulher negra praticando sadomasoquismo. O vídeo parece provocar em Simone tanto um desejo sexual quanto os seus medos mais profundos, em um misto de nojo e fascinação. Gradualmente, Simone entra em uma jornada de conhecimento das práticas de BDSM (Bondage, Discipline and Sadomasochist) com sua amiga Lucia, vivida por Lorena Comparato, e seu roommate Coyote, papel de Lucas Andrade. Porém, Lucia começa a se sentir desconfortável com a violência, qualificando o desejo de Simone como um reflexo do machismo da sociedade, expondo a contradição que essas práticas tem com o trabalho de defensoria pública em que ela atua. Simone precisa decidir se segue sua busca sozinha, descobrindo os limites entre o risco, o desejo e a obsessão.

Sobre a consagração do filme no festival, a diretora disse: “Ganhar esse prêmio nesse momento em que a extrema direita detém o poder no país, valoriza um filme que representa tudo o que eles odeiam e tentam exterminar”. Para Murat, esse é um filme sobre afeto, escuta e consensualidade; Regra 34 competiu no evento com 16 produções de diferentes países.

Com distribuição da Imovision, o filme conta também com Georgette Fadel, Márcio Vito, Rodrigo Bolzan, Dani Ornellas, Babu Santana, Lucas Gouvêa, Mc Carol, Simone Mazzer, Raquel Karro, Marcos Damigo, Julia Bernat, Marina Merlino, Samuel Toledo, Luiza Rolla e Yakini Kalid no elenco. O roteiro é assinado por Gabriela Capello, Julia Murat, Rafael Lessa e Roberto Winter.

O júri da Competição Internacional foi presidido pelo produtor Michel Merkt e contou também com: Prano Bailey-Bond, cineasta galês; Alain Guiraudie, diretor e roteirista francês; William Horberg, produtor americano; e Laura Samani, cineasta italiana. 

Giovanni Venturini e o produtor Justin Pechberty com o Leopardo de Ouro.

Além disso, o curta-metragem Big Bang, de Carlos Segundo, uma coprodução entre Brasil e França, foi premiado com o Leopardo de Ouro da mostra Pardi di domani Concorso Corti d’autore. Com Giovanni Venturini e Aryadne Amâncio no elenco, o filme narra a história de Chico, um homem com nanismo que trabalha consertando fornos. Solitário, ele vive um conflito interno contínuo, resultado do sentimento do abandono familiar, principalmente o paterno, e da exclusão social que o persegue. Mas, Chico irá pouco a pouco descobrir uma forma de resistência e, por que não, de vingança. O curta uma produção da Les Valseurs e da Sopro do Tempo; a distribuição no Brasil é da Casa da Praia Filmes.

Giovanni Venturini, protagonista do filme, subiu ao palco e fez um discurso emocionante: “Hoje, estar aqui é significativo para mim. Talvez essa seja a primeira vez que uma pessoa com deficiência recebe esse prêmio. Sou ator há quinze anos, tenho fugido de personagens estereotipadas por anos. Eu estava num momento bastante desmotivado com a indústria brasileira de cinema quando veio o convite para protagonizar Big Bang e me encheu de esperança novamente. Muito obrigado ao diretor e meu amigo Carlos Segundo, pelo presente que foi esse filme. Obrigado à produtora francesa Les Valseurs. Esse prêmio não é apenas nosso, mas para todos os corpos invisíveis na sociedade. Que Big Bang cause uma grande explosão e revolução de ideias na criação de protagonistas de filmes, dando voz a diversidade que existe na nossa sociedade. Eu estou muito feliz, muito obrigado, Locarno!”.

Já o Leopardo de Ouro de melhor curta-metragem internacional foi para a produção cubana Soberane (Sovereign), dirigida e protagonizada por Wara, de Fortaleza, indígena e não-binária, que estuda na EICTV, Escuela Internacional de Cine y Televisión. Na trama, Hakan não deseja voltar ao Brasil, mas não sabe como dizer a Lissy que não pode mais lhe oferecer uma vida dos sonhos fora de Cuba. Hakan luta contra a indecisão quando Lissy descobre que ele escondeu dela a chance de sair da ilha. Fora das opções que lhes permitem ficar, Hakan deve aceitar a nova pessoa que ele se tornou para voltar para casa.

O júri da Pardi di domani foi formado por: Walter Fasano, montador italiano; Azra Deniz Okyay, cineasta turca; e Ada Solomon, produtora romena.

Outro destaque brasileiro foi É Noite na América, de Ana Vaz, uma coprodução entre Itália, França e Brasil. A obra recebeu Menção Especial no Pardo Verde WWF, prêmio ambiental do festival; o documentário retrata a batalha entre a expansão urbana de Brasília e o deslocamento de sua fauna local.

Conheça os vencedores do 75º Festival de Cinema de Locarno:

COMPETIÇÃO INTERNACIONAL

Leopardo de Ouro | Melhor Filme: Regra 34, de Julia Murat (Brasil/França)
Prêmio Especial do Júri: Gigi la legge, de Alessandro Comodin (Itália/França/Bélgica)
Melhor Direção: Valentina Maurel, por Tengo sueños eléctricos
Melhor Atriz: Daniela Marín Navarro, por Tengo sueños eléctricos
Melhor Ator: Reinaldo Amien Gutiérrez, por Tengo sueños eléctricos

MOSTRA CINEASTI DEL PRESENTE

Leopardo de Ouro | Melhor Filme: Svetlonoc (Nightsiren), de Tereza Nvotová (Eslováquia/República Checa)
Prêmio Especial do Júri: Yak Tam Katia? (How is Katia?), de Christina Tynkevych (Ucrânia)
Melhor Direção Emergente: Juraj Lerotić, por Sigurno mjesto (Safe Place)
Melhor Atriz: Anastasia Karpenko, por Yak Tam Katia? (How is Katia?)
Melhor Ator: Goran Marković, por Sigurno mjesto (Safe Place)
Menção Especial: Den siste våren (Sister, What Grows Where Land Is Sick?), de Franciska Eliassen (Noruega)

PARDI DI DOMANI | COMPETIÇÃO INTERNACIONAL

Leopardo de Ouro | Melhor curta-metragem internacional: Soberane (Sovereign), de Wara (Cuba)
Leopardo de Prata: Buurman Abdi (Neighbour Abdi), de Douwe Dijkstra (Holanda)
Melhor Direção: Total Refusal, por Hardly Working
Medien Patent Verwaltung AG Award: Mulika, de Maisha Maene (República Democrática do Congo)
Menção Especial: Madar tamame rooz doa mikhanad (Mother Prays All Day Long), de Hoda Taheri (Alemanha)
Curta-metragem indicado ao European Film Awards: Buurman Abdi, de Douwe Dijkstra (Holanda)

PARDI DI DOMANI | Concorso Corti d’autore | Leopardo de Ouro: Big Bang, de Carlos Segundo (Brasil/França)

PRIMEIRO FILME

Melhor Primeiro Filme: Sigurno mjesto (Safe Place), de Juraj Lerotić (Croácia)
Menção Especial: Love Dog, de Bianca Lucas (Polônia/México/EUA) e De noche los gatos son pardos, de Valentin Merz (Suíça)

PRÊMIO FIPRESCI: Stone Turtle, de Ming Jin Woo (Malásia/Indonésia)
PRÊMIO ECUMÊNICO: Hikayat elbeit elorjowani (Tales of the Purple House), de Abbas Fahdel (Líbano/Iraque/França)
PRÊMIO EUROPA CINEMAS LABEL: Nação Valente (Tommy Guns), de Carlos Conceição (Portugal/França/Angola)

Clique aqui e confira a lista completa com os vencedores do Festival de Locarno 2022.

Fotos: Locarno Film Festival/Ti-Press/Massimo Pedrazzini e Samuel Golay.

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